Ana - Matando o amor com atropelamento e fula
Hoje sinto-me bem, sou bonita, sou sorridente, sou feliz.
Sinto olhares de cobiça por todo o corpo. Os rapazes querem a boca e, desesperadamente, as mamas; as raparigas preferem os olhos, o cabelo e as pernas firmes.
Ando mais devagar apenas para dar prazer aos que passam por mim, porque na verdade estou ligeiramente atrasada.
Gosto de chegar cedo e organizar o trabalho do dia. Como sou muito inteligente e astuta, faço, sem nenhuma dificuldade, as tarefas do gabinete. Brilho em todas as reuniões e como todos me consideram tanto, já deixo uma hora ou duas do meu dia para ajudar os colegas nos seus pequenos problemas e questões.
A vida corre-me bem, posso afirmá-lo. É, aliás, evidente no meu maravilhoso tom de pele, mas sobretudo no monumental tamanho do meu coração. Tenho tantos amigos que o meu órgão central mais parece uma conta do facebook.
Ontem, durante a sessão de destartarização, o Dr. H perguntou-me se eu não gostaria de -corrigir o pequeno espaço que tenho entre os incisivos de cima.
_ Acrescentaria mais um pontinho à sua, já inigualável, perfeição! _ disse ele.
Fiquei a pensar nisso. Nos dentes separados. Destes de mentirosa, disse uma vez a tua mãe.
Tive a firme sensação de que se corrigisse esse pequeno detalhe a minha vida mudaria para sempre.
_ Não, não quero Dr. H. Sinto-me maravilhosa assim! Aliás, estou maravilhosa assim, não acha?